domingo, 7 de abril de 2013

Vale qualquer tipo de desenvolvimento?!


Geraldo Trindade

Nunca como nos dias atuais as questões psicológicas, os desajustes emocionais e receitas para “sarar” tais desarranjos estiveram em alta. Não é de se espantar que livros e textos sobre relacionamentos, afetividade, bem-estar, crescimento interior estejam na crista da onda e rapidamente se proliferam. É sabido também que temas como desigualdade social, questão ambiental, desigualdade, exploração são tomados como antiquados e desnecessários. O importante passou para a esfera da tecnologia, do desenvolvimento, da informação, dos meios de comunicação, dos comodismos da vida moderna: carro, viagens, celulares, tablets, computadores...
            Vem uma pergunta: vale qualquer tipo de desenvolvimento? Vale crescermos e atingirmos condições de consumo enquanto há pessoas sendo escravizadas, mortas, exploradas, desalojadas de suas casas, afastadas de suas famílias, vivendo em condições sub-humanas? Vale o Brasil “crescer” e se “desenvolver” a custa de sofrimento humano e da destruição ambiental?
            Não sou contra nenhum desenvolvimento e nenhuma comodidade da vida moderna. Nem sou contra o grande desejo do Brasil querer se transformar em um país de primeiro mundo. Sou sim contra um desenvolvimento, onde cada um de nós não se sente satisfeito com o que tem. Sou contra um desenvolvimento onde se ama as coisas e se utiliza as pessoas. Sou contra um desenvolvimento que não considera o respeito à vida e à história das pessoas e ao meio ambiente.
            O Brasil, tanto para os colonizadores quanto para os próprios brasileiros, foi e é visto como terra de exploração: pau-brasil, ouro, cana de açúcar, café, borracha, minérios, energia... São também muito os exemplos de projetos, planos e obras que só visam o lucro sem considerar os malefícios sócio-ambientais. Quer-se chegar a qualquer custo aos padrões de vida das grandes potências, mas este padrão não será usufruído por todos, pois é levado adiante desconsiderando as minorias e as parcelas mais sofridas e necessitadas. “O aspecto de conquista e exploração dos recursos tornou-se predominante e invasivo, e hoje chega a ameaçar a própria capacidade acolhedora do ambiente: o ambiente como ‘recurso’ corre o perigo de ameaçar o ambiente como ‘casa’.” (Doutrina Social da Igreja - DSI, 461).
            Exemplo disso é a obra do Belo Monte, uma usina hidrelétrica que está sendo construída no Rio Xingu no Pará, próximo à cidade de Altamira. A construção dessa obra é marcada por conflitos. Tem-se levantado questões muito prática, apresentadas por movimentos sociais, moradores da região e alguns técnicos.
            Pelo fluxo próprio de água da região amazônica a usina operará em determinadas épocas do ano com capacidade reduzida, ou seja, ela responderá somente por 10% da produção energética do país. A obra está orçada em mais ou menos 30 bilhões que poderiam ser investidos em outras fontes de energia como a solar e eólica. A área inundada prevista é de 640 Km quadrados, o que possivelmente afetará o fluxo de água, como também o escoamento natural do rio, afetará a fauna e a flora; além de ter como área de inundação regiões habitadas por ribeirinhos das cidades de Altamira, Ambé e área rural de Vitória do Xingu. Isso atinge diretamente pessoas que construíram ali a sua vida e sua história.
            A alteração ecológica afetará não só a região, mas todo o planeta; tendo em vista a função pulmonar da floresta amazônica no equilíbrio ambiental. Além disso, há o impacto social com o deslocamento de milhares de pessoas de todo o país para uma região que não tem ainda infraestrutura para acolhê-los e que acarretará em problemas sociais, como saúde e educação de baixíssima qualidade; prostituição, violência, uso de drogas, exploração escrava; ocupação desordenada, tráfico de drogas e humano.
            Dessa forma, é preciso, em pleno século XXI, refletirmos se vale a pena a sustentação de obras de um falso desenvolvimento que se estende e avança à revelia das mazelas humanas. Por maiores que sejam os benefícios ele não pode e não deve existir se leva a destruição de semelhantes, de homens, mulheres, jovens e crianças que têm suas vidas destruídas pela ganância. Além do mais, é sempre bom como cidadãos ficarmos atentos para percebermos que não estamos sozinhos no mundo e fazemos parte de uma aldeia global, que precisa do nosso zelo e do nosso cuidado, a fim de que as gerações futuras possam usufruir dos benefícios naturais e humanos. Não podemos jamais cairmos na mentalidade laxa de que “quanto mais melhor” ou então o “importante é desenvolver, mesmo a custa de muitos sofrimentos e vidas”.
            Fica-nos o conselho de que “a atitude que deve caracterizar o homem perante a criação é essencialmente a da gratidão e do reconhecimento: de fato, o mundo (a natureza, as pessoas) nos reconduz ao mistério de Deus, que o criou e sustém. Se tornamos incidental nossa relação com Deus, a natureza é esvaziada de seu significado profundo, e nós a depauperamos. Se, ao contrário, chegamos a descobrir a natureza na sua dimensão de criatura, é possível estabelecer com ela uma relação comunicativa, colher seu significado evocativo e simbólico, penetrar assim no horizonte do mistério, franqueado ao homem a abertura para Deus, Criador dos céus e da terra. O mundo se oferece ao olhar do homem como pegadas de Deus, lugar em que se desvela a Sua força criadora, providente e redentora.” (DSI, 487)
            Vale a pena algumas sugestões de sites que nos ajudam a refletir a problemática Belo Monte: Movimento Gota d’água (http://movimentogotadagua.com.br ) e Xingu Vivo (http://www.xinguvivo.org.br ).






Um comentário:

  1. Olá, Geraldo.

    Li seu texto no Adital e resolvi passar por aqui.

    Acredito que partilhamos do mesmo medo, da mesma fobia e estarrecimento ao ver o nosso país adotando modelos de crescimento que são ultrapassados e extremamente eurocêntricos (quando não norte-americanos). A nossa potencialidade de desenvolvimento poderia ser mais ampla, mais transparente e mais limpa ao colocarmos outras prioridades no desenvolvimento (o que difere, economicamente, de crescimento).

    Ou seja, não apenas colocar o ser humano a serviço do capital financeiro e industrial e, sim, o inverso: dar-mo-nos uma "antropológica" que nos faz reviver e repensar nosso modelo. O Brasil talvez seja o país mais propício aos eixos de desenvolvimento.

    Deixamos o Nordeste em péssimas condições na Colônia, apenas usurpando de seus recursos; depois, com Sudeste, parece ter havido a coisa paralela. No Sul, onde eu moro, o momento histórico e o modelo diferenciaram um pouco. Enfim.

    Passarei por aqui.

    Um abraço,

    Marcelo

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