Geraldo Trindade
“Missionariar” e “misericordiar” colocados como verbo indicam ação e movimento. No âmbito eclesial estas duas realidades se ligam a um mistério muito maior, pois apresenta a ação do Espírito Santo, ruah, sopro, que impulsiona e dá vida à Igreja e a direciona à vivência da fidelidade no seguimento do Seu Senhor, Jesus Cristo.
O missionário de hoje na vida da Igreja não é mais unicamente aquele que sai de
sua casa, de sua cidade e do seu país e vai a outros pregar o Evangelho. A
missão é, sobretudo, “missio Dei – missão de Deus”. Se compreendemos que a
missão tem sua origem em Deus, assim também o agir do cristão, do missionário
tem sua origem em Deus. Por Ele é chamado (Is 6, 1-13; Jr 1, 4-10; Mt 4,
18-22), por Ele é capacitado (1 Cor 1, 27) e nEle se encontra as
verdadeiras motivações (Jo 17, 18).
A missão tem sua origem no coração amoroso de Deus, assim Ele envia seu Filho
Jesus como a Palavra definitiva do Seu amor, a fim de que se cumprisse a missão
que o Pai lhe confiara, de restaurar todas as coisas (At 3, 21). Assim, o Filho
se torna nosso intercessor junto ao Pai e suplica sobre a humanidade o Espírito
Santo, que age na vida do cristão capacitando-o a dar testemunho, restaurando-o
do homem velho e o tornando um homem novo (Ef 4, 17-32). Essa missão se
estende no mundo por meio da Igreja ( Jo 20, 21), pois ela é povo escolhido que
se faz santo por meio do batismo, chamado para a missão. “Ide, fazei discípulos
meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito
Santo, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei.”(Mt 28,19-20).
Quando se fala em missão deve-se passar para o seu agir, “missionariar”,
cumprindo o mandato de Cristo. Não basta compreender a urgência da missão, mas
é preciso que se crie consciência de que é ação de cada batizado, a fim de que
não reduza sua vivência de fé a uma pertença eclesial fria e monótona, mas se
perceba membro que se coloca a serviço da evangelização e do testemunho do
Evangelho.
“Missionariar” é sair como discípulo missionário,
colocando-se a render os talentos, a criatividade, a sabedoria e a experiência
para levar às outras pessoas a mensagem da ternura, da compaixão e da
misericórdia de Deus. Lembra-nos o papa Francisco: “A misericórdia encontra a
sua manifestação mais alta e perfeita no Verbo encarnado. Ele revela o rosto do
Pai, rico em misericórdia: ‘não somente fala dela e a explica com o uso de
comparações e parábolas, mas sobretudo Ele próprio a encarna e a personifica’
(João Paulo II, Enc. Dives in
misericordia, 2).
Aceitando e seguindo Jesus por meio do Evangelho e dos Sacramentos, com a ação
do Espírito Santo, podemos tornar-nos misericordiosos como o nosso Pai
celestial, aprendendo a amar como Ele nos ama e fazendo da nossa vida um dom
gratuito, um sinal da sua bondade (cf. Bula Misericordiae
Vultus, 3). A primeira
comunidade que, no meio da humanidade, vive a misericórdia de Cristo é a
Igreja: sempre sente sobre si o olhar d’Ele que a escolhe com amor
misericordioso e, deste amor, ela deduz o estilo do seu mandato, vive dele e
dá-o a conhecer aos povos num diálogo respeitoso por cada cultura e convicção
religiosa.”
Por isso, o “missionariar” da Igreja deve ser também “misericordiar”, ou
seja, que a misericórdia seja ação e imperativo eclesial e pessoal.
“Misericordiar” deve ser conjugado em toda a vida do cristão a fim de que dando
misericórdia se receba misericórdia, ser agente da misericórdia antes ser alvo
da misericórdia de Deus. Ir como Igreja ao encontro dos homens e mulheres do
tempo de hoje com suas feridas e dores e querer saná-las com uma presença de
amor humano que revelem o amor divino de Deus numa ação constante de
“misericordiar” para que o rosto de Deus revelado em Jesus seja apresentado com
mais realce em seu atributo: ser misericordioso.